terça-feira, 21 de janeiro de 2020

MASS OF SOULS - ENTREVISTA DEZEMBRO DE 2019




O Doom Metal brasileiro sempre foi, de certa forma marginalizado. É um fato que grupos de Thrash, Death ou Black Metal surgem em maior quantidade e constituem carreiras de maior longevidade nas terras tupiniquins que os grupos de Doom Metal. A primeira edição do Bruxa Velha dá ênfase nessa cena ainda desconhecida de tantos guerreiros e tantas guerreiras. A Mass of Souls é um grupo misterioso. Uma dupla que vive das influências moribundas vindas de Paradise Lost, The Cross e Candlemass, adentrando no underground nacional com uma sonoridade lenta, agonizante. Demos então a palavra ao vocalista, Binho Carvalho, que recebeu o Bruxa Velha zine em casa e cedeu essa entrevista. 

Bruxa Velha Zine: Conte um pouco sobre a gênese da Mass of Souls: ano de formação, o que vocês estavam pensando ou fazendo naquela época?

Binho – A Mass of Souls se originou em 2016 como um projeto e veio a se concretizar como banda mesmo no final de 2018, se não me engano. Mas o foda é que a gente demorou esse tempo todo pela escassez de músicos, e os que havia, não estavam disponíveis. Então a gente resolveu meter as caras como um duo, e desde então, não paramos. Antes da Mass of Souls existir, me recordo que no início éramos um projeto de Deathgrind, um som bem toscão nessa linha do Napalm Death, muita influência do Carcass. Até que o Arysson (baterista) veio com uma ideia de tocarmos um som mais lento. Lembro que eu não curti a ideia de início, pois até então só gostava de bandas rápidas, meu início no metal foi com bandas tipo Vader, Slayer. Até que eu parei para escutar coisas mais lentas. O que me fez ter apego por isso não foi o Doom Metal propriamente, mas sim o Black Metal, um álbum do Amen Corner, Jachol Ve Tehila. Foi “amor à primeira escutada” (risos). Desde então, viemos seguindo essa linha. A gente tentou compor algumas coisas, mas saíram péssimas e deixamos de lado. Tínhamos uma música chamada ”Betty”, uma merda (muitos risos), que apesar de ruim, tinha uma pegada com muita influência do Amen Corner. A gente pensa em lançar ela como uma demo depois... a partir daí, mergulhamos de cabeça no Doom Metal; se tornou um vício, uma paixão. 

Bruxa Velha Zine: Vocês são a segunda banda de Doom Metal do estado de Sergipe a ter lançado algo oficialmente, além da Scarlet Peace. Conte um pouco como veio a ideia de lançar um EP. Isso aconteceu do nada, houve algum planejamento?

Binho – A gente planejou bastante. A Mass of Souls tem bastante tempo como projeto. Durante esse tempo, antes de começarmos a tocar e ensaiar, já vínhamos compondo, pensando em como iria funcionar as gravações e tudo mais; não precisamos fazer covers nem nada disso pois já tínhamos um repertório próprio. O único cover que resolvemos tocar foi Solitude, do Candlemass, e isso bem depois do EP já estar gravado. Não tínhamos nem mesmo o lançado, se bem me lembro, havíamos somente divulgado o single Dark River of Lost Souls. Demorou bastante, mas ao menos eu fiquei satisfeito com o que fizemos. 

Bruxa Velha Zine: Você falou algo que é muito discutido nos dias de hoje entre as hordas do Underground: bandas cover. Alguns apontam que é mais vantajoso sair tocando Metallica e Guns N’ Roses por aí pois sempre haverá um público para pagar, ao contrário do que acontece com grupos autorais. O Bruxa Velha Zine não apoia bandas cover, mas o que você pensa sobre isso?

Binho – Financeiramente, é sim um ramo muito mais ajustado. Mas só se você desejar dinheiro e mais nada. Acho satisfatório ter uma identidade. Eu comecei com covers, quando eu resolvi me tornar um vocalista. Achava legal alguém dizendo “olha lá, aquele cara canta parecido com fulano”, mas hoje penso que é mais gratificante quando me reconhecem pelo que faço – “porra, aquele é o vocal da Mass of Souls”. Isso é mais legal do que ser tratado como uma imitação.

Bruxa Velha Zine: A Mass of Souls é um grupo que tem um apego muito forte com o oculto, mas não é um grupo que ataca diretamente religiões ou defende vertentes satânicas como a LaVeyana ou o Luciferiana. Explique se essa postura é proposital. Vocês vivem isso de verdade ou é algo mais teatral? Há divergências entre vocês sobre isso?

Binho – Atacar diretamente religiões não nos interessa pois isso é algo que todos vêm fazendo e não é impactante. Boa parte das bandas de Metal extremo hoje em dia escrevem coisas como « pau no rabo de cristo », « matem cristãos » e coisas assim. Isso é falta de criatividade. A Mass of Souls preza pela escuridão, pelo sinistro, e é obvio que isso vai de encontro aos princípios cristãos. Nosso ataque à religião é mais oculto, mais indireto. Sobre os conceitos do que escrevemos, toda arte tem um viés teatral. Música também é assim. Mas digo que o que levamos adiante em termos de postura na Mass of Souls, os temas que escrevemos, é o que vivemos de verdade. Prezamos pela individualidade – nos encarregamos de nós mesmos, e o resto, que vá viver suas vidas. Sobre as divergências, houveram sim, no início, mais voltadas no quesito do som : eu gostava mais de coisas rápidas, Depois, isso mudou. Acredito que os gostos mudam, isso não quer dizer que eu despreze gêneros como o Thrash ou o Death Metal, mas ampliei minha visão sobre música e entramos em acordo. Sobre as temáticas, nunca houve divergências, pelo menos não da minha parte. Quando vamos compor, das letras às composições, fazemos tudo juntos.



Bruxa Velha Zine: Vamos falar um pouco sobre « Tales of a Rebel Soul ». Conte um pouco sobre os conceitos, a recepção do EP. Fale também sobre a decisão de disponibilizá-lo nas plataformas digitais: você acredita que mídias físicas ainda valem a pena ?

Binho – O EP tem um conceito pagão. As letras foram embasadas a partir de uma religião morta, o orfismo. Pesquisamos sobre isso e desenvolvemos a história da alma rebelde. Sobre a recepção, está sendo bem melhor do que eu esperava. Causou algum rebuliço na cena do Doom nacional. Ouvi muitas críticas positivas e isso nos ajudou bastante. Eu não acreditava muito que o EP fosse ter uma boa recepção. Como grupo, passamos um sufoco muito grande com a produção, com essas coisas. Eu pensei que seria muito se as pessoas do estado pudessem nos ouvir, mas fiquei surpreso com a expansão do « Tales». Pessoas de outros estados e até de outros países gostaram. Isso foi muito bom. Sobre as plataformas digitais, a Mass of Souls nasceu na era digital, mas optamos por fazer um lançamento físico também. Vejo esses meios digitais como uma faca de dois gumes. A dibulgação pela internet é muito maior, isso é fato. Mas você perde de ver o seu material rodando, sendo trocado, passando de mão em mão, o que pra mim é algo bem melhor. As pessoas também tem preguiça de ir à um evento ou ir na casa de um amigo pra ouvir um CD. As pessoas vivem em duas moradias : uma física e uma na internet, e até o jeito de usar a internet mudou... antes os blogs eram populares, hoje são os perfis. Então pra alcançar alguém na internet é mais fácil. Pra uma banda iniciante, eu recomendo. Isso não vai te tornar mainstream (muitos risos). 

Bruxa Velha Zine: Uma questão que abordamos em outra entrevista é o formato que os grupos de Metal vem tomando. One-man bands e duplas vem se tornando cada vez mais comuns. Você acha que isso é um reflexo dos tempos atuais, onde as pessoas se veem mais isoladas e com egos maiores?

Binho – Eu não sei como te dizer. Eu acredito que o ego pode ser uma máscara para o fracasso... A questão da One-man band, depende do som que você quer fazer. Vamos tomar como exemplo o Metal extremo: sempre tem alguém interessado em tocar covers de bandas tipo Cannibal Corpse, Sepultura. Mas aí tem aquele cara que não curte essa ideia, e esse cara busca fazer o seu som sozinho porque ele não vai encontrar alguém interessado em tocar ou partilhar as mesmas ideias. Outras vezes é a preguiça da pessoa de meter as caras e procurar alguém, fica acuado com isso. Até hoje, a Mass of Souls analisa bastante sobre colocar mais alguém no grupo, pois funcionamos bem como dupla. Nós não tivemos nenhum apoio e ainda não temos (risos), mas o que não nos fez desistir foi a paixão pelo que fazemos e a nossa insanidade. Metal aqui onde vivemos já é difícil de ter apoio, pra Doom Metal então, é muito pior. Acredito que somos todos loucos (risos). Não existe Doom Metal mainstream no Brasil, apenas underground, e o underground só tem o apoio dos próprios headbangers. 



Bruxa Velha Zine: Vocês vão lançar uma demo no final de 2019, 3 meses após lançarem « Tales of a Rebel Soul ». Isso foi intencional? Porque lançar em um espaço de tempo tão curto?

Binho – Como eu já disse antes, sempre conversamos sobre tudo o que faremos, sobre os próximos passos. Falamos bastante sobre isso, mas não posso te dizer como e quando essa demo vai sair. Mais tardar, em 2020, mas prezarei pelo oculto (risos). Já disponibilizamos o título e a capa na internet, a demo se chamará « Rites of the Mass », e é isso.

Bruxa Velha Zine: Sergipe não tem uma cena de Metal com grande projeção no Underground, mas em compensação, os grupos possuem personalidade. Você destacaria algum grupo ou horda?

Binho – Temos bandas aqui com 20, 30 anos de atividade, tipo a Karne Krua, Scarlet Peace. Eu escuto muito a Incestus Kadaverikus, um som muito fodido, black/death metal sinistro. Escuto também a Silent Vanity ; sempre estou de olho nos grupos pra saber quem está colaborando com a cena sergipana. A cena realmente tem personalidade e como um headbanger sergipano, não posso ignorar esses grupos.

Bruxa Velha Zine: A entrevista está chegando ao final. Sinta-se livre para tecer um comentário para os leitores ou dizer algo que queira sobre a Mass of Souls.

Binho – Aos leitores, primeiramente eu agradeço. Agradeço também ao Bruxa Velha Zine pela oportunidade. A Mass of Souls preza pelo bom e velho Doom Metal, sempre. Vamos todos, não só no nordeste mas no país inteiro apoiar o underground. Me incomoda bastante essa desunião na cena, mesmo que no papel todo mundo fale sobre isso. Quando uma banda cresce, outro fica com inveja e aí boicota. Isso é uma merda sem necessidade. Se você não gosta do som, foda-se, mas é o apoio que faz a cena da sua cidade crescer. Não tem pra quê falar mal da banda de ninguém. Vamos não só falar, mas praticar a união, pois isso é o que fortalece. Only doom for your doomed souls!




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Todos os direitos pertencentes a Mass of Souls;

Entrevista retirada da versão impressa do Bruxa Velha Fanzine.

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